Com o horário inflexível de uma cantina soviética, o café Correia, junto aos CTT de Vila do Bispo, brinda-nos com uma cozinha divinal, e uma senhora infernal.
A senhora que atende, única e inconfundível, tem orgulhosamente prantados pelas paredes diplomas de má educação. Esses diplomas são textos inequívocos, vertidos por sobreviventes das agruras do serviço, paladinos subservientes de um certo sado-masoquismo gastronómico que se justifica orgasmicamente nas sublimes iguarias artesanais a que só se tem acesso ocupando estoicamente umas das esparsas mesas presentes na sala.
As mesas têm toalha de pano e espaço para circular à vontade entre elas, luxos há muito esquecidos, combatidos pela tecnocracia triunfante, perita na rentabilização encafuante dos espaços e dos modos.
Chegam quatro espanhóis. Murmúrios. E ela diz “Não, não temos lista em espanhol, e se não quiserem esperar, podem sair porque não fazem cá falta nenhuma.” Curto e grosso. A Europa ficou à porta. Ali ainda está vivo o Portugal profundo, milenar e sábio.
Os espanhóis reagem. Resistem. Rendem-se. De trombas, ficam.
Quando saímos estão descontraídos, inebriados, anafadamente giboiando após o inesquecível festival de sabores autênticos, desconhecidos das gerações mais novas, e considerados já extintos por muitas das restantes.
São 14h30. Acabou. A porta é trancada. Não entra mais ninguém.
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