Fui ontem ao Museu de Arte Antiga, nas Janelas Verdes, observar os painéis de S. Vicente. Os inacreditáveis originais!
UAU! UAU! UAU! …
UAU nº 1) Não tem nada a ver com os quadros da época ou posteriores. A técnica, o virtuosismo, são insólitos, deslocados, modernos. Os vizinhos retratos de D. Sebastião, e de outras figuras da época, pecam comparativamente por singeleza estética, por insuficiente categoria pictórica, por falta de luz e detalhe apurado. De D. João I a D. Sebastião, perdeu-se uma técnica única, aderiu-se a um cânone europeu. O resultado foi para esquecer.
UAU nº 2) As caras. Que caras! São mesmo caras, faces vivas e com personalidades autênticas. Que diferença para a constelação de obras menores que os rodeiam naquela e noutras salas, onde as caras são tão apagadas, tão sempre iguais umas às outras na sua passividade intemporal, dispostas rigidamente pelas três ou quatro expressões que os artistas cultivavam como suprasumo estético absoluto. Um pouco como a actual revista HAPPY que só sabe publicar capas com gajas esqueléticas e anoréticas.
Agoras as caras que estão nos painéis. Aquilo sim, aquilo é de gente viva, prática, sem preocupações de redicularias estéticas.
UAU nº 3) A luz, o brilho, o realismo fotográfico. Quando, ainda nos anos do liceu, encontrei pela primeira vez os painéis, apenas as imagens, o que me mais me espantou foi o brilho dos metais, representado de forma tão actual e tão distante do comum medieval. Na altura, fui particularmente sensível a esse detalhe, pois comparava as diferentes soluções apresentadas pelos diversos autores de banda desenhada. O neorealismo americano de matriz fotográfica era incontornável. E de repente, ei-lo nuns painéis do sec. XV??! Só pode ter sido feito com uma camara escura. Tem que ter sido feito com uma camara escura!
O brilho das vestes. A rede, que nunca estaria numa cerimónia, foi lá colocada depois, e destoa porque é postiça, é um trambolho mal desenhado e pior executado. Agora as vestes, as faces!
O fato da princesa, com cortes laterais como aqueles que hoje são usados pelas strippers eróticas. Desculpem, mas que se passava naquela altura??! A Inquisição veio estragar muita coisa…
UAU nº muitos: As espadas, tão bem feitas, tão realistas, com cabelos no punho!! Verdadeiras colhoeiras portuguesas.
“As espadas portuguesas tinham na guarda uma protecção para o dedo indicador, o que lhes permitia colocar o referido dedo à frente da guarda, e poder assim puxar e retirar a espada depois da estocada, servindo-se dela tal como se de um espeto se tratasse, e adicionalmente, tal como os outros, como se fosse uma moca, num movimento horizontal ou vertical de grande amplitude. Os portugueses tinham que ser exímios esgrimistas porque esta utilização da espada obrigava a saber esgrima, para posicionar os pés na estocada.”
Nada têm a ver com a espada decorativa que está no retrato de D. Sebastião.
UAU (Uau(uau(…))): As cores, as faces, os brilhos, os detalhes, a técnica, a mestria.
O que nós eramos e no que nos tornámos, por não acreditarmos em nós próprios, por cedermos ao facilitismo importador.
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Enfim, só vendo.
Outros observadores, outras observações.
Outro leitores, outras leituras.
Mas a obra é!
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PS:
Digam lá se não é uma janela com pilastra central que está tão fotográficamente refectida neste capacete:
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