O ilusionista pedia a colaboração do público. Pedia apenas uma letra. Uma singela letra. Pedia que alguém a escrevesse numa folha de papel e a colocassse no envelope ao lado do outro, onde já estava a letra.
Dizia, afirmava que controlava a mente de todos. Jurava que a letra que alguém escrevesse estava sob o seu controle e era a que estava secretamente naquele envelope por abrir. Acertava sempre.
Mais um dia, mais um espectáculo.
Entrou na câmara de vidro e pôs o capacete ligado ao computador. Sons, silvos e luzes enxameavam-lhe o exíguo habitat, enquanto escrevia coisas no teclado. O enxame multimédia dissipou-se. A impressora de segurança emitiu um envelope fechado. A diligente assistente colocou-o na urna transparente bem à vista de todos.
E pediu uma letra, que alguém escrevesse uma letra numa folha de papel.
Alguém o fez. Cumpriu as instruções e não deixou nínguém saber, dobrando e redobrando o papel.
O ilusionista pegou nele, inspeccionou-o, abriu-o sem deixar mais ninguém ver, e voltou a dobrá-lo. Foi à vista de todos, mas só ele é que viu o que lá estava escrito.
Pegou num outro envelope e colocou o vincado papel lá dentro. Lentamente, fechou o envelope. Sempre à vista de todos, o envelope foi também colocado na urna transparente, ao lado do primeiro.
Retirou-se para a câmara de vidro e repôs o capacete. Os sons, silvos e luzes surgiram novamente, enquanto teclava. O multimédia esgotou-se. Saiu e fez sinal.
A sempre prestável assistente abriu a urna transparente bem à vista de todos.
E, inutilizando os envelopes, mostrou a todos os conteúdos respectivos.
Em ambos, a mesma letra.
Sucesso. O ilusionista nunca falhava.
– – –
O espectáculo era monótono.
Quando, anos atrás, tinha vendido a alma para poder saber o futuro, nunca pensou que só o poderia fazer mediado por um computador com um software diabólico. E que o máximo que poderia ver no futuro eram cinco minutos apenas. E somente uma letra.
Podia conhecer o futuro, mas transformava-lhe a vida num inferno.
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