E viva o Aeroporto

Começando pela Conclusão:

É tão óbvio que a Portela tem que fechar que só o facto de ainda existir me faz arrepios. Até porque trabalho num sítio em que quando os aviões passam, à tal cadencia de não sei quantos por minuto, até consigo ver os parafusos da fuselagem. E devem existir locais da cidade onde até é possível ler o manual de instruções de abertura das portas. Por isso deixem lá de defender a existência de um aeroporto que fazia sentido quando a cidade terminava na praça do Marquês de Pombal.

 Agora o resto:

O mais que impressiona é o método de decisão! Sem pôr em causa estudos ou idoneidades, num programa de TV um inginheiro põe em questão o estudo doutro inginheiro porque este último gastou 6 meses (ou menos?) a escrever um documento a pôr em causa a localização na Ota alegando que o processo de decisão para a localização do novo aeroporto tem 30 anos de estudos.

30 ANOS???? (Se calhar ouvi mal, nasci antes de 1977. Neste país de eterna juventude NINGUÉM nasce antes de 1977) Trata-se de indecisão, Incompetência pura e simples ou a manifestação daquele hábito bem português de DEIXAR TUDO PARA O FIM, para quando estamos à rasca? Ou ainda não estava definida propriedade dos terrenos a serem expropriados (para ser mauzinho)?? Quanto desperdício de talento e dinheiro!!!! Ainda por cima para justificar uma escolha que depois é colocada em causa em duas penadas (seis meses Ah!)…

Para isto também contribui uma boa dose do “agora é que os bou f’der” que, em Portugal, se manifesta em toda a sua glória cada vez que uma decisão é tomada. Aparecem logo os tipos que sabiam mas não foram ouvidos (“Eu bem lhes disse!”,”Eu tive acesso a um relatório…”), os que participaram mas não viram (“A ponte caiu?”,”Eu era o responsável?”,”Qual cassete?”,”Ah! Pois… Tinha ido à casinha. Mas estava lá o porteiro”) ou os que viram mas guardaram na adega para futura utilização(“Com esta ainda te lixo”) ou que sentem que lhe pisam os calos (“Sabes que o gajo…”). Todos nós temos um pouco desta sabedoria escondida e recalcada.

Há 30 anos (1977!!! Como disse já quase ninguém nasceu antes disso)  nem existiam PC’s!!! O Bill Gaitas talvez nem sonhasse ainda em andar nos caixotes do lixo a copiar código para o primeiro SO (o CPM). Para terem a capacidade de processamento que hoje temos em qualquer computador (dos mesmo rascas, daqueles obsoletos que lá estão em casa e que ainda não pusemos no lixo porque as garrafas estão primeiro) necessitávamos, talvez, do equivalente a uma bela moradia com muitas divisões. O Autocad era um sonho de escritor de Ficção Científica. O Windows nem aparecia no “2001 Odisseia no Espaço” em que os computadores já falavam (e se bem se lembram, o monitor do HAL era, horror!, a preto e branco!).

Os Pink Floyd tinham lançado o Animals e estavam a aparecer os Sex Pistols e o Punk. Em Portugal ouviam-se temas revolucionários (A gaivota que voava e a pedra que filosofava) e queimavam-se dependencias de partidos lá pró Norte, com o beneplacito de sua eminencia o Cónego Melo.

Em Portugal a Valentim de Carvalho era a maior discoteca e para comprar algo especial tinha que se importar (mandando dinheiro pela surra…) ou comprar na discoteca do Carmo (aquela que agora só vende fado). Fnac? Qual Fnac?

A Margaret Tatcher nem tinha ainda sido eleita primeiro-ministro em Inglaterra! Andávamos (andavam porque eu nem tinha 18 anos) a ver os primeiros filmes porno como se fosse arte (Garganta Funda, etc.).

O Cavaco nem sonhava em ser primeiro e o Sá Carneiro ainda não era mártir (Mas já estavam a planear o dossier Camarate desde 1950 – Sim! Porque em Portugal qualquer conspiração leva 30 anos a ser congeminada para não existirem equívocos na decisão! Aliás a revolução de Abril começou a ser pensada em 1944, pelo pai do Otelo)

O pessoal andava todo de bigode e barba revolucionária com calças à boca-de-sino e sapatos com dez centímetros de sola. Discutia-se aturadamente a esquerda e a direita, tendo vencido o dogma “A minha politica é o trabalho”, que mais ou menos 30 anos depois (Coincidência?) ditaria a vitória de um tal Tony (aliás “O botas”, aliás “O da cadeira”) num concurso de TV.

Voar era um luxo, existia uma regra (ou lei) que impedia que um português saísse com mais de 30 ou 40 cts no bolso (Isto já nos anos 80!!) , cantava-se o Hino pra dentro e demonizava-se o fado (excepto o Carlos do Carmo) e nem sequer existiam engarrafamentos para a ponte porque, na altura, só uma em cada cinco famílias possuia viatura própria.

30 ANOS para tomar uma decisão… Que povo este…

Corolário:

Já viram a quantidade de prédios que se podem vir a construir na área liberta na Portela? Bai ser um maná de carago meuje amigojes! Felizmente ao ritmo a que a nossa população cresce qualquer dia somos apenas um milhão, as construtoras finalmente extinguem-se e o mercado até funciona.


Publicado

em

, ,

por

Etiquetas:

Comentários

5 comentários a “E viva o Aeroporto”

  1. Avatar de alex
    alex

    eh eh eh
    Fartei-me de rir.
    Já nem me lembrava das calças à boca de sino nem dos bigodes revolucionários… Talvez porque somos da mesma idade, e bigode só tinha quando bebia cerveja ou quando chupava o buço de uma gaja na Defensores de Chaves…
    Espera aí… Na Defensores de Chaves eram elas que nos chupavam a nós, não era?
    Fomos lá uma vez num carro que não metia a 2ª nem tinha travão de mão, lembras-te?
    Ah. Não me lembro se o Hal tinha um monitor a PB, mas era certamente um CRT daqueles curvos que já não se vêem em lado nenhum.

  2. Avatar de carnide
    carnide

    Quando eu era miudito, o meu pai, militar de carreira, passava largos anos em Africa, mobilizado. Uma das vezes que ele estava ca’ supreendi-o numa conversa, não sei se com o meu tio ou com o meu primo, a discutir se o novo aeroporto seria na Ota ou em Rio Frio.
    Muito antes de 77. Muito antes de 74. No politiquês correcto de agora, reescreve-se tantas vezes a história que até dá dó. Ota-Rio Frio começou em 77 porque antes de 74 não se pensava em Portugal. Pelo menos, é isso que temos de acreditar.

  3. Avatar de nick name
    nick name

    Temos então que pensar positivamente. Antes de 74 e tendo em atenção que a revolução na realizade nunca existiu, iniciou-se o processo que daria origem ao processo de estudo que posteriormente daria origem ao processo de decisão sobre a localização do novo aeroporto. Passaremos num futuro incerto ao processo de contrução e posteriormente ao processo de inauguração do dito aeroporto. Depois de passado o processo teste e o processo de operacionalização da coisa, chegara-se-á à conclusão de que já ninguém anda de avião…

  4. Avatar de carnide
    carnide

    neologismo: Realizade – realização da realidade, realidade realizada, contruída. Provém da disonâcia cognitiva entre a realidade real, e a realidade contruída, realizada pelos realizadores cinematográficos, jornalistas, intelectuais e outros actores dos mass media lavadores cerebrais.

  5. Avatar de nick name
    nick name

    Ora aí está como um erro tipográfico dá origem a uma nova palavra a entrar, com toda a propriedade, na próxima edição de um qualquer dicionário 🙂

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *