Dexei-me dormir com as imagens da manif em Madrid contra a Eta. Ódio contra ódio. Sobre o 11 de Março, nem uma palavra. No passeio do sonho era verão, e estava a ver uma exposição de banda desenhada numa megalópolis espanhola, mistura de Barcelona com Madrid. O desassossego levou-me a sair por uma porta lateral, e estava na estação central dos combóios, misto de lojas “Corte Ingles” com atavismos pre-franquistas. Dei duas voltas pelo espaço, vendo as várias saídas para as “calles”, as várias montras, e observando toda a fauna do shopping enquanto procurava decidir se comprava bilhete para Lisboa, ou para Andorra. O bilhete para Santarém era o mais caro de todos, e estava calor. Decidi comprar um gelado. De fragola e vanilla. Ai o ter de falar, e perguntar o preço. O gajo coloca-me as bolas de gelado num prato, mexe-as com uma colher, mistura-as, e cobra-me um euro e setenta e cinco! Ai o caraças. Sento-me no balcão a olhar para o pires com a massa misturada a escorrer, peganhenta e fria, a pensar “Raios destes gajos, são tão esquisitos”.
A mulher por trás do balcão usava uma colher de pau para mexer e remexer uma panela inox com massa de gelado enquanto a segurava entre as pernas e suava com o esforço. O tipo saca um papelinho de um terminal tipo multibando, e entraga-mo. São 5.73 €, para pagar à saída, naqueles senhores ali.
O que!!? Sim, é por me ter sentado. Rapidamente me apercebi que se me deslocasse e sentasse no banco do lado, voltava a ter de pagar 5.73 €. Mas que coisa. Estava a ficar aborrecido com a sensação que estava a ser chulado e gozado. Que bando! Não admira que usem terminais tipo multibando.
O gajinho afastou-se do balcão, foi lá atrás, tirou o avental e saiu. Bom, deixou de me poder irritar, pensei eu. Preparei-me para meter a colher no gelado, mas o prato já não estava lá! Antes de sair, o gajo tinha-o levantado! Irra! Não tinha dado por nada. Tantos euros de despesa e nada, não tinha comido nada. Estava a ser gozado, mas isto não ia ficar assim. Rapidamente fiz o meu plano, ia voltar a pedir o gelado, à empregada que restava, ia levantar-me e sentar numa mesa, e depois não saía por aqueles senhores. Ia mas era saír por uma porta lateral, que tinha topado nas minhas voltas iniciais, sem senhores nenhuns. E eles que ficassem com os seu terminais multibando e contas de 5.73€, que eu ficava com o meu geladito.
Mas estava nervoso, tenso. E se viessem a correr atrás de mim? Que vergonha. E se a porta lateral tivesse sido fechada entretanto? E se outra coisa corresse mal, ou se eles arranjassem outra desculpa para me chularem? Estava tenso e ansioso enquanto pegava no gelado e caminhava para a mesa. Que desconforto. Ajeitei-me melhor na cama e a magia do sonho desfez-se. Ah, que alívio por estar deitadito na minha camita.
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