O princípio do utilizador-pagador é um elemento retórico originário do discurso ambientalista. Hoje, de uma forma fantástica, foi apropriado pelas forças contrárias aos trabalhadores e cidadãos. Argumentam os inimigos do povo que o cidadão que usa um bem público deve pagar mais do que o que não usa. E por uma questão de justiça. A justiça é um argumento caro aos reaccionários. Sempre com uma preocupação por uma justiça milimétrica. Não fosse o gajo que contribuíu sem usar ficar prejudicado em 500 paus. Assim se propõe que o cidadão que paga impostos para um serviço o pague novamente quando o utiliza. Ou seja, assim se propõe uma dupla tributação, disfarçada de rigor moral e contabilístico.
O mesmo princípio, curiosamente, não parece estar em vigor quando o cidadão não utiliza o serviço a que supostamente devia ter acesso. Assim, o contribuinte que pagou impostos para ter uma creche para os filhos não vê restituído o dinheiro por o estado não lhe disponibilizar qualquer creche. O utente da saúde não vê restituído o dinheiro pelos serviços que o estado afinal não lhe presta. Ao utente das escolas não é restituído o dinheiro por estas não terem o mínimo de qualidade. Ao utente dos tribunais não é restituído o dinheiro por a decisão demorar um tempo que a torna inconsequente. Não. Nada disso. O princípio do utilizador pagador só tem um sentido. Tem o sentido de fazer o cidadão pagar duas vezes. Nao tem nunca o sentido de libertar o cidadão das prestações correspondentes aos serviços que deviam efectivamente ter sido prestados mas que não o foram.
O principio do não-utilizador não-pagador permanece por inventar. Mesmo quando o não-utilizador o é contra a sua vontade própria. No fundo, é o tal principio que nos devia libertar do pagamento das reformas que não vamos ter.
P.S.: Como sabem os que me conhecem, não frequento cinemas. Nos últimos 10 anos só fui uma vez ao cinema. O filme que vi chamava-se Le peuple migrateur. Um belo filme. Aqui vão umas imagens.
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