Zé Pedro

Não, eu não conheci o Zé Pedro; ou talvez sim. Mas deixem-me começar a história.

1975

O Liceu Nacional de Almada não tinha espaço nem condições para os alunos do 1º ano – hoje 7º ano de escolaridade – e conseguiu que o Seminário de Almada lhe emprestasse oito salas. Fui, então, estudar para o Seminário. Foi um ano de imensas greves, muitas duraram uma semana, mas algumas duraram duas semanas e até mais. Lembro-me de bater à porta do Seminário e o porteiro dizer: “não há aulas, volta daqui a uma semana”, ou “volta daqui a duas semanas”.

Tivemos poucas aulas e nem sempre tivemos todos os professores. A professora de francês só deu aulas nas duas últimas semanas. Era uma professora estranha. Sentava-se em cima da mesa – eu nunca tinha visto um professor sentar-se em cima da mesa -, tinha estado na Argélia, era muito dinâmica, baixinha, magra, tinha cabelo curto e preto: uma mulher demasiado avançada para os nossos hábitos de então.

Na minha turma havia uma miúda parecida com uma atriz americana. “Parece a Marylin”, disse eu um dia ao meu pai. E ele perguntou-me: “É loura?”. “Não”, respondi, “parece-se com a Marylin em tudo, menos na cor do cabelo”. Não me lembro do nome dela. Vi-a muitas vezes, depois disso, a passear em Almada com o namorado, hoje marido, o Tim.

Em 1980 fui aprender música para a Incrível – Sociedade Filarmónica Incrível Almadense – por sugestão da minha tia Amália. Depois de passar a famigerada centésima lição de solfejo, escolhi um instrumento para tocar na banda… mas deram-me outro.

“Então, que instrumento é que queres tocar?”, perguntou-me o Sr. João – músico trompetista que era simultaneamente o “capataz” da banda. “Saxofone”, respondi. “Saxofone, saxofone. Toda a gente quer tocar saxofone”, retorquiu ele.

Umas semanas antes, eu tinha dito ao meu pai que queria tocar saxofone. E ele achou um disparate e disse-me que trompete é que era, com trompete é que um músico podia brilhar, como o Louis Armstrong.

“Então pode ser trompete”, anuí eu. Deram-me um fliscorne, que é semelhante ao trompete, mas menos agreste, com um som mais macio.

Uns anos depois, já fora da banda, comprei um saxofone tenor usado. Vi um anúncio no Se7e e fui a Sesimbra buscá-lo; levei um amigo que tocava saxofone na SFIA, que confirmou que estava afinado. Era um instrumento difícil, e acabei por comprar um saxofone soprano, em saldo, em 1987.

Coloquei o tenor à venda, em 1988, também no Se7e, e telefonou-me um tipo. Combinámos encontrar-nos no Rossio. Fui até Cacilhas a pé, e depois, do Terreiro do Paço – onde atracavam os barcos – até ao Rossio, com aquele peso na mão. O tipo chegou e disse-me: “Vamos até ali mais à frente, para um amigo meu me dar uma opinião sobre o saxofone”. Fomos até ao Coliseu – já não podia com aquele peso -, e ao chegarmos, havia imensa gente à porta para entrar para um espetáculo. Entrámos por uma porta lateral, percorremos uns corredores e entrámos no camarim da banda.

Estava lá a banda toda. Reconheci o Tim. O Gui experimentou o saxofone e disse, ao amigo, que estava afinado, mas que era um pouco duro. Depois virou-se para mim: “o IPJ ofereceu-me um Selmer, o Selmer é mais macio, muito mais fácil de tocar”.

Não me lembro se ele me comprou o saxofone. Sei que o vendi. E vendi também o soprano. Comprei um Selmer mais tarde. Realmente é mais fácil de tocar.


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