os cagadores

É vê-los madrugadores. Todos os dias. Pontuais. De manhã e à tarde. Faça chuva ou faça sol. Faça frio ou faça calor. A cagar os jardins públicos e as ruas. É uma missão. São os cagadores. Acompanhados do seu instrumento levado à trela. São as ruas que merecemos. São os jardins que achamos que as nossas crianças merecem. É a aposta na captação de turistas, o turismo fecal. As cidades do país estão reféns da arquitectura cagagística.

Para os cagadores, existe um único objectivo. Cagar no que é público. Cagar nos jardins públicos para que exista uma diferença entre os jardins públicos e os outros. Porque os jardins públicos são tão bons como os privados. Excepto que estão cheios de merda.

Os cagadores acham-se sempre civilizados. Não cagam nas suas portas. Cagam sempre nas portas de outrém. Bem faz o Belmiro. Nos centros comerciais dele ninguém caga. Nem pensem em levar o saquinho para apanhar o cocó. Aí já não há cagadores. Aí já não é espaço público. Aí o cagador não exige o direito inalienável a cagar. O espaço público é o único no qual o cagador sente a compulsão de cagar. Incomoda-o a higiene e a beleza do espaço público. Incomoda-o que possa ser um local de lazer e socialização agradável. Os cagadores não gostam do que é público. São agentes do imperialismo.

É um empenho fantástico, o dos cagadores. Meio milhão de horas diárias a passear animais. Um milhão e duzentos mil cães. Todos a cagar, duas vezes ao dia. O maior investimento voluntário de horas na sociedade portuguesa. Não têm meia hora para os filhos. Nem para os cônjuges. Mas têm tempo para ser cagadores. Não tens tempo para os nossos filhos? Não tens tempo para mim? Nunca tens tempo para mim? Eles a passear o cão e a mulher feliz e aos gritos com o chouriço do vizinho bem entalado e a uivar. Provavelmente à canzana. Provavelmente de quatro no chão. Belos pares de cornos. Merecidos. Agora vai passear o canito, vai.