Capital Democrático e direitos futuros

Quando pensamos que o nosso voto eleitoral é pessoal, instransmissível e inalianável, garante da nossa cidadania e liberdade democrática, talvez não devessemos esquecer que o voto é também, um valioso activo pessoal, intrasmissivel e inalianável, que garante o funcionamento histórico dos sistemas democráticos, na sua mais pura essência, um cidadão, um voto. O seu somatório elege a governação do país, por cidadãos que para tal se candidatam para nos representar em tais actos, através da mediação das organizações políticas legalmente constituidas ( e.g. os partidos políticos).

Ora, em tempos de escassez de capital – e de votos – este enorme valor que está conferido, pulverizadamente, é certo, a cada cidadão nos seus plenos direitos, poderá e deverá ser posto mais eficazmente ao serviço do todo (i.e. do sistema político, económico e social) de forma mais potencializadora do reforço da desejada sustentabilidade democrática.

Os direitos de voto, no presente e no futuro, a cada um pertencem, mas, a todos interessam, enquanto raiz do movimento dinâmico e cumulativo de reforço do poder individual de contribuição para reprodução e consolidação dos sistemas democráticos, por esta via essencial.

Os partidos políticos, presentemente, são os únicos fièis depositários, à posteriori, nos momentos eleitorais pré-definidos por lei, desse poder do voto. Os partidos, enquanto por princípio organizações de emanação democrática, reunem e representam, em torno de um conjunto de ideais e objectivos, os direitos, presentes e futuros, do poder de voto dos cidadãos do país, assim divididos por essas matrizes e propostas “ideológicas” de mediação, representação social e acção económica e política.

A dinâmica entropica deste sistema está aparentemente em forte movimento crescente, podendo levar, a curto-prazo, à (maior) descrença da “utilidade do voto”, logo, a mais elevados níveis de não participação (e.g. abstenção), e, consequentemente, ao enfraquecimento das “dinâmicas circulares” do sistema de representatividade política e social, e de funcionamento democrático, tal como as conhecemos até à data: partidos > votos > eleições > governação > partidos > eleições > votos > governação…

A constituição e a organização dos Direitos Futuros de Voto (DFV) dos cidadãos, parece pois uma idéia fundamental e arrojada, é certo, mas indispensável, plena de sentido e de oportunidade, para a garantir a renovação e a robustez futura da “democracia”.

Segundo este conceito, há que assegurar a valorização e remuneração deste verdadeiro Capital Democratico, pessoal e instransmissível, para garantir aos cidadãos os seus mais amplos e plenos direitos de participação e controlo da sua utilidade de utilização.

O poder dos DFV poderá e deverá ser confiado e depositado, tal como um capital monetário, numa instituição de gestão e valorização desses activos intangíveis de propriedade individual, equalitária e universal ( e.g. um cidadão = um voto).

A constituição de um BANCO DE VOTOS, apartidário, democrático e popular, enquanto fiel depositário desse capital comum dos cidadãos, parece, hoje mais do que nunca, ser imprescindível concretizar, prementemente, perante as crescentes taxas de abstenção na participação eleitoral, as quais ultrapassam já metade do todo eleitoral, no caso português cerca de 3 milhões de votos não utilizados regularmente.

Vamos pois, considerar que os DFV poderiam ser entregues à guarda e à gestão de um BANCO DE VOTOS – gerido supra-partidariamente pelos orgãos de soberania judicial – para o bem comum de garante democrático, sendo por essa acção remunerados todos os cidadãos que para tal optassem depositar, com total confidencialidade, o seu compromisso de voto futuro.

Deste modo, conforme a vontade livre e democrática dos cidadãos, seriam efectuados depósitos voluntários dos DFV em função dos calendários eleitorais previstos para o futuro, em “cofres” secretos e invioláveis do BANCO DE VOTOS. A remuneração do depósito desse “futuros” (activos pessoais), deveria ser remunerada de acordo com taxas inerentes a horizontes temporais diversificados no tempo (longo, médio ou curto-prazo). Perante este valiosíssimo “capital democrático” depositado, os seus proprietários (e.g cada cidadão votante aderente) seria remunerado com “juros” inerentes ao seu capital. Por “juros” entenda-se bonificações de ordem fiscal ou outra, exponencialmente variáveis segundo o compromisso de futuro assumido.

A “garantia contratual” de contar com um número conhecido de votos, pré-eleitoralmente, seria de inexcedível valor e interesse para o sistema político democrático e para todos os cidadãos.

Poderia saber-se de antemão, o número de votos que contribuiriam para determinada eleição. É obvio que, em qualquer momento, o proprietário do capital depositado (e.g. do voto) poderia alterar o seu objecto de voto (e.g. a sua escolha política e partidária); o que não poderia fazer era alterar era o seu compromisso de participação, pré-assumido com antecedência, de contribuir com o seu voto para determinado acto eleitoral.

O escrutínio popular da governação far-se-ia, deste modo, em bases muito mais estáveis, mas não necessáriamente mais “fechadas” ou permanentes de escolha do objecto de voto (e.g. o partido X, Y ou Z). Forçaria, isso sim, a uma governação mais responsável, com menor incerteza quanto à base eleitoral, originando por sua vez desempenhos, políticas e propostas mais objectivas e menos “oportunistas” para captação dos “abstencionistas”. Logo, maior “verdade e rigor eleitoral”.

A robustez do sistema político democrático sairia também reforçada, pois a participação e universalidade de voto estaria plenamente assegurada, com uma maior amplitude e sustenção representativa da sua base. A “tentação abstencionista” e de nulidade do voto seria drásticamente reduzida, sendo pertinente e seguro pensar que todos nos sentiriamos mais justiciados e objectivamente mais associados e intervenientes no “continuum” democrático.

Probido mesmo seria contrair empréstimos e garantias ou efectuar penhoras sobre esses capitais.


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Comentários

Um comentário a “Capital Democrático e direitos futuros”

  1. Avatar de alex

    A “maior verdade e rigor eleitoral” seria distorcida pelo preço do voto, pelo preço que os partidos estivessem dispostos a pagar por cada voto, ou lote de votos.

    Mas retiraste o melhor à ideia, que é mesmo o poder vender os votos, e os futuros (warrants) dos votos, em bolsa – numa Bolsa de Direitos de Voto. Aqui sim, temos o mercado a funcionar.

    Uma outra vantagem deste sistema seria a maior fidedignidade das sondagens. Estado os votos vendidos de antemão, seria muito mais fiável elaborar uma antevisão do resultado das eleições.

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