Vénia a Saramago

Saramago passou a vida às turras com alguns intelectuais e outros burros de Portugal. Chamou-lhes os nomes mais inconvenientes e incómodos: alguns responderam outros não.

Agora que ele se foi e já não pode ripostar, todos lhe fazem a vénia, embora alguns continuem engasgados.

Vénia e honra em Portugal e no Mundo

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Mas pensando bem, raciocinando de forma científica, é possível encontrar uma possível relação causal entre a rejeição (quase exílio) de Saramago e a conquista do Prémio Nobel. Será que Sousa Lara e Cavaco queriam mesmo que Saramago recebesse o Nobel? É que, na minha opinião, foram eles os criadores do “lobby” que o levaram até ao pódium em Estocolmo.

Recordem um pouco da história e digam-me se não concordam…

A iniciativa, tomada pelo subsecretário da Cultura António Sousa Lara, de eliminar o livro ‘O Evangelho Segundo Jesus Cristo’ da lista de concorrentes ao Prémio Literário Europeu, levou Saramago a afirmar-se “triste e indignado”. Antes de o facto ocorrer, em Abril de 1992, Saramago já havia decidido que iria “viver alternadamente em Portugal e fora”. O incidente deu-lhe o empurrão final. No ano seguinte estabeleceu-se com a mulher em Lanzarote (lhas Canárias), onde comprou uma vivenda, que passou a ser a residência fixa do casal.

Sousa Lara justificou a sua atitude considerando que a obra em questão “não representa Portugal”, e “atacava princípios que têm a ver com o património religioso dos portugueses.” A polémica foi áspera. O livro fora condenado por figuras gradas da Igreja, entre as quais D. Eurico Dias Nogueira, arcebispo de Braga, que o considerou “uma delirante vida de Cristo” e que se referiu ao seu autor como “réu”.

Na circunstância, Saramago qualificou o gesto de Sousa Lara como acto de censura. “O facto é brutal”, considerou. Em relação à transferência da residência para Lanzarote, encarada pela opinião pública como manifestação de protesto, o escritor rejeitou a palavra “exílio” para designar a condição de emigrado a que se remeteu. Nos anos que se seguiram manteve-se crítico em relação à atitude e ao governo, dirigido por Cavaco Silva, que a concretizou.

A distinção de Saramago com o Nobel da Literatura, seis anos depois da iniciativa de Sousa Lara, colocou este e os seus apoiantes numa situação incómoda. O antigo subsecretário de Estado congratulou-se com a escolha do português, mas acusou-o de dispor de “um enorme ‘lobby’ internacional a seu favor”.

O pessoal da Comissão Nobel adora dar prémios a escritores perseguidos. Sousa Lara foi um amigalhaço incompreendido. E provavelmente hoje está arrependido de ter ajudado Saramago…

… ainda ontem disse que voltava a fazer o mesmo, portanto: ou fazia parte do lobby, ou é parvo.


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Comentários

4 comentários a “Vénia a Saramago”

  1. Avatar de freedomfighter
    freedomfighter

    Três vivas para o amigalhaço!!

  2. Avatar de escrotinador
    escrotinador

    “um enorme ‘lobby’ internacional a seu favor”?

    És um incompreendido, ó Sousa Lara…

  3. Avatar de nick name
    nick name

    Grande lugar na história para Sousa Lara: o homem que censurou o Nobel

  4. Avatar de alex

    Eu acho que foi ele que deu o Nobel ao Saramago. Se o Saramago não “parecesse” estar a ser perseguido pelo Governo, nunca teria recebido o prémio.
    Acho que foi tudo combinado entre eles (Sousa Lara e Saramago), ou então, o SOusa Lara gosta mesmo muito do Saramago e ofereceu-lhe este presente.

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