Hábitos


Esta história conta-se num instante. Há muitos anos, na posse já duma coleção de discos senão invejável, pelo menos numerosa, os amigos que ia a minha casa, admiravam-se do facto de, cada vez queria ouvir determinado disco, sabia com uma precisão, quese milimétrica onde esse disco se encontrava. O resto, do meu quarto, excepto os livros, também ordenadinhos, primava por um certo caos (Sim, ontem, como hoje passo meia hora à procura do raio da chaves antes de sair de casa).

Isso continuou mesmo durante o casamento em que, sendo dada importância a alguma ordem em casa, esta mania de ter ordem nos discos e livros eram, de certa forma, uma bizarria do gajo, respeitada e com vantagens, mas uma bizarria.

Tudo ia bem até ao momento em que, estando mais em Almada, se alugou a casa onde “residiam” os discos. Estes, assim como os livros e outro recheio da casa foi passar uma temporada a uma arrecadação onde, escusado será dizer, toda e quelquer esperança de ordenação se perdeu.

Entretanto a coleção crescia, o casamento acabava, a colecção mudava de arrecadação e a minha resposta a “e o disco tal?” passou a ter como resposta, “não faço a mínima ideia”.

Caos instituído

Mas um outra forma de lidar com a coleção surgiu. O critério que passou a rodear a selecção de um disco para ouvir, um livro para ler, começou a ter uma grande dose de aleatoriedede, deixando de dominar a regra da novidade. A seleção resulta quse sempre num reencontro. Reencontros que trazem alegrias (“Grande disco”, “grande disco”), incredulidades (“Olha… Tenho isto…”) e alguns amargos.

O que é certo é que o critério predurou, se entranhou, passou a ser um hábito digo de orgulho. Ao mesmo tempo, muito lentamente, mas mesmo muito lentamente, livros e discos iam ganhando o seu lugar num espaço onde a ordem impera.

Agora, devido a ter que juntar tudo num mesmo espaço, urge colocar tudo por ordem, de novo. A obra já começou, mas ainda se irá prolongar por umas semanas.

Sinto já uma nostalgia do imprevisto apesar de que não será tão cedo que tal deixará de acontecer, mas que irá acontecer em breve. Quando, mais uma vez, conseguir localizar à primeira um qualquer disco de cumbia.

O principio da arrumação

Um comentário a “Hábitos”

  1. Eu também tinha as ferramentas “organizadas” dessa maneira. Sabia exatamente onde estava cada uma, e até podia entrar na sala das ferramentas às escuras que encontrava sempre a ferramenta certa.
    Um dia a Maria “arumou” as ferramentas e desfez-me o meu mapa mental. Agora já comprei várias cópias das mesmas ferramentas, porque nunca consigo encontrar nada naquela sala, nem sequer já encontro as que acabei de arrumar.

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